A crise que se anuncia para a safra 2012-2013 (Publicado em 01/06/12)

A crise da laranja na safra 2012/2013

 

Depois de um ano com uma safra muito acima do esperado, entramos neste ano com produções ainda altas, maiores do que se poderia esperar.

A safra 2012/2013 está estimada pelas indústrias em 364 milhões de caixas, uma safra ainda bem considerável depois de uma safra a princípio estimada em 387 milhões de caixas, mas que acabaram por render 428 milhões de caixas devido ao tamanho que as frutas atingiram em consequência das chuvas. Também existia uma expectativa que a seca observada entre Janeiro até Abril deste ano provoque uma redução, a qual aparentemente está sendo revertida com as chuvas do final de Abril e Maio. Estamos praticamente entupidos de suco, após a moagem de aproximadamente 360 milhões de caixas na safra passada, com um mercado internacional retraído e as indústrias tentando resolver o problema devido a contaminação do suco Carbendazim, o que fez com que alguns navios tanques ficassem vagando mundo afora sem destino enquanto as negociações não chegam a um número razoável para venda deste produto.

Nossos colegas do lado de cima do equador tiveram um aumento na safra da Flórida, que passou de 140 milhões de caixas na safra 2010/2011 para 145 milhões de caixas nesta safra 2011/2012. Coincidência ou não, nossos colegas também estão enfrentando problemas com seca. A safra americana contando com os demais estados produtores permaneceu praticamente inalterada (204,9 milhões de caixas em 2010/2011 e 204,5 milhões de caixas em 2011/2012).

 

- Concecitrus:

Os primeiros passos do Concecitrus em direção a um acordo sobre os preços e condições de pagamento para a próxima safra já foram dados. Os trabalhos para negociação estão sendo coordenados por Alexandre Mendonça de Barros, economista da MB Associados, contratado para este fim pela Sociedade Rural Brasileira. Segundo Mendonça de Barros, as indústrias já abriram suas planilhas de custo e forneceram os dados necessários para as negociações no setor. Os produtores terão que torcer muito para que esta representação seja de fato a favor da cadeia produtiva e não trabalhe com cartas marcadas como está se prevendo em conversas no campo pela forma como foi constituído o Concecitrus.

O mercado mundial de suco tem encolhido sendo, desta forma, necessário um esforço conjunto para que não se perca mais espaço ainda nesta competição internacional. O grande problema atualmente é a total falta de coordenação por parte dos produtores de laranja, em boa parte estimulado por ações das indústrias de suco junto aos grupos que foram se formando. Esta situação tende a agravar o problema para o lado do produtor. Sem união não haverá sustentabilidade no setor. O número de produtores de laranja tenderá a continuar caindo e a cadeia ficará cada vez mais frágil.

 

- OMC:

Citrosuco e Cutrale estão prestes a conseguir uma retaliação em US$ 3 milhões pelo governo dos Estados Unidos em favor do Brasil. O que ocorreu é que ambas conseguiram a condenação da barreira contra o suco brasileiro, obrigando a devolução dos valores cobrados de forma injusta. O valor que os Estados Unidos se propuseram a reembolsar referem-se somente as exportações de Março/2011 para diante, o que não foi aceito pelas empresas, e com razão neste caso específico. Mas já deram indícios de que irão desistir do processo junto a Organização Mundial do Comércio (OMC) e acabarão aceitando o valor proposto pelos Estados Unidos, alegando que existiriam muitas dificuldades por questões burocráticas e financeiras. Processar alguém exige tempo e muito dinheiro. Na maior parte das vezes o que ocorre é um custo envolvido no processo maior que os benefícios que quem moveu a ação poderá obter. Além disso a barreira somente cairá efetivamente a partir de Abril de 2013. Esta barreira penaliza as exportações brasileiras de suco a mais de 10 anos, e em um caso semelhante ocorrido com o Algodão os EUA acabaram por concordar em devolver US$ 147 milhões. Um mesmo problema, com mesmo desfecho na OMC, reações bastante diferentes em relação ao problema. É algo para se pensar.

 

- “Concorrência”:

A concentração do processamento de frutas parece não ter mais fim. Em Março a Louis Dreyfus Commodities firmou contrato de compra ou arrendamento da Cocamar em Paranavaí, com capacidade de moagem de 6 milhões de caixas de 40,8 kg de laranja, podendo chegar ao dobro deste volume. Esta foi uma reação ao avanço neste mesmo sentido das demais fábricas processadoras, que já anunciaram aumento das suas operações na região sudoeste paulista, região abrangida pelos municípios de Bom Sucesso de Itararé, Capão Bonito, Coronel Macedo, Guapiara, Itaberá, Nova Campina, Ribeirão Grande, Riversul, Taquarivaí, Barão de Antonina, Buri, Itapeva, Itaporanga, Itararé e Taquarituba (veja mapa abaixo).

A Cutrale anunciou que irá transferir a Bascitrus do Noroeste Paulista (Mirassol, perto de São José do Rio Preto) e a KB Citrus para uma nova unidade a ser construída, o que significa a transferência de 102 máquinas extratoras, o que irá conferir uma capacidade aproximada de 2,5 milhões de caixas por ano. Já a Citrovita comenta-se que irá transferir sua unidade de Matão, com uma capacidade para receber 500 mil caixas de laranja por dia aproximadamente,  para a região central do estado, também para o sudoeste paulista.

Este movimento concentrará grande parte da capacidade de moagem de laranja no sodoeste paulista. Os motivos desta migração estão relacionados a dois fatores principais: preço da terra e incidência de doenças, como será discutido adiante.

 

- O caso Carbendazin:

Proibido sua utilização nos EUA desde 2009, o atual bloqueio da entrada do suco por contaminação por Carbendazim ficou parecendo que estavam apenas esperando que o estoque de suco com algum resíduo deste defensivo acabasse para que fosse dado um golpe em nossas exportações. Mostrando uma incompetência fantástica, as indústrias de suco simplesmente não se antecipou em tomar medidas para evitar que algum tipo de resíduo deste produto entrasse no mercado americano, provocando esta bagunça que se anuncia para esta safra de laranja.

Para quem já sofreu com acusações de “mão de obra escrava”, “menores de idade colhendo laranja” e outras medidas para conter o avanço, além da taxação, já deveria estar mais do que ciente que o jogo não é lá dos mais limpos nestas questões internacionais. Por este mesmo motivo, já deveriam ter previsto que era uma questão de tempo para que algum setor se visse incomodado com a situação sua ou em relação ao suco brasileiro e resolvesse descontar em “nosso” produto.

O mercado americano não é nosso principal cliente e poderia ser atendido com suco proveniente ou da laranja própria produzida antecipadamente sem a utilização desta molécula, ou pela elaboração de contratos de fornecimento de frutas que exigissem a não utilização de produtos do grupo dos Benzimidazóis. Não haveria e não há necessidade do banimento desta molécula dos pomares de laranja brasileiros. A proibição nos EUA está afetando somente o suco de laranja. A maçã consumida pelos americanos continua a ser tratada com produtos deste grupo. Mais uma vez a falta de coordenação da citricultura brasileira promoverá uma crise de credibilidade do nosso produto no mercado internacional.

Da maneira como foi colocado no exterior esta questão, deu-se a entender que houve negligência por parte dos produtores de laranja brasileiros, uma vez que, pelo menos nos Estados Unidos, as leis e regras no que diz respeito a resíduos de produtos e quais são registrados ou não para a cultura são bastante claras e publicadas. Neste caso desde 2009. Não prestar atenção a este pequeno “detalhe” acabou sendo fatal para esta safra.

 

- “Greening”, CVC, Morte Súbita e Cancro Cítrico:

A fatura está chegando ao campo já com um pouco de atraso em relação ao estimado por diversas fontes do setor. E infelizmente o valor está com muitos “zeros” antes da vírgula para aqueles que assumiram o risco de conviver com a doença. Como já previsto anteriormente, alguns pomares encontram-se totalmente infectados, muitos já foram arrancados e é assustador o cenário que se desenha em grande parte das regiões produtoras.

Aparentemente os pomares mais ao Norte do estado estão sendo menos afetados, com a presença de apenas poucos pomares com grande infestação, semelhante ao que observamos em relação ao Amarelinho (ou CVC) na região de Holambra, Aguaí e arredores, onde apenas alguns pomares apresentaram sintomas mais severos e tiveram de ser erradicados precocemente, antes de atingirem o sexto ano após o plantio.

Em termos de avanço, o Greening tem se mostrado mais agressivo nas regiões Centro (Araraquara) e no Sul (Araras, Itapetininga), curiosamente nos locais para onde está ocorrendo a migração das indústrias processadoras. É esperado um avanço no número de pomares condenados pela doença nos próximos anos bastante significativo, em boa parte devido ao abandono das inspeções e erradicação de plantas sintomáticas, o que tem feito aumentar de forma bastante rápida o número de plantas com sintomas severos nos pomares. A tendência por enquanto é de as maiores perdas ficarem entre a região central e sul do estado.

O CVC foi a grande mola propulsora da citricultura para regiões mais ao sul do estado. Mostrou grande capacidade de digerir o patrimônio investido em pomares de laranja. A doença normalmente não provoca a morte das plantas, mas as reduções observadas na produção acabam por inviabilizar sua exploração comercial. Os custos para manutenção de um pomar nas regiões mais afetadas pela doença ficaram mais altos quando comparados às demais regiões produtoras. Com o passar dos anos a grande citricultura que havia se desenvolvido na região minguou. Outro empurrão para baixo foi sentido em menor intensidade pela ação da Morte Súbita dos Citros, que afetou pomares mais próximos a Barretos seguindo em direção Norte para a divisa do estado.

As perdas acabaram por ocorrer tanto em pomares de fornecedores quanto em pomares plantados pelas indústrias processadoras. Em alguns pomares destas processadoras foi verificada a perda total dos plantios de mais de 1.000 ha! Este é um fato extremamente relevante, pois estas perdas não estão sendo computadas como despesa nas avaliações do custo de produção feitos pelas indústrias.

O outro grande flagelo que voltou a fazer vítimas é o Cancro Cítrico. Este último acaba por provocar danos menos significativos às plantas e as perdas técnicas de safra ocorrem muito mais por ação das leis que obrigam a erradicação. O que foi observado nos dois últimos anos é uma redução significativa da fiscalização e ações que obriguem o produtor a arrancar plantas infectadas e pomares condenados. Na região de Pongaí e Cafelândia, cidades próximas a Marília, parte dos citricultores já adotaram por conta própria a convivência com a doença como prática. Como as leis ainda não foram alteradas e nem há indícios de que isto venha a ser feito em médio prazo, caso ocorra uma intensificação nas vistorias e nas ações da Defesa Sanitária em relação ao controle desta doença pela aplicação da lei, ocorrerá na prática a falência de produtores e abandono de áreas em produção em uma escala significativa.

 

 

- O caso Cana de açúcar:

Para quem não se recorda ou que não tenha vivido nesta época, na década de 70, no meio da ditadura, havia uma regra criada pelo governo que limitava as usinas a produzirem no máximo 60% da cana que estariam processando. Foi uma tentativa de limitar a verticalização da produção, a qual não obteve sucesso como todos nós sabemos muito bem. A lei passou a ser burlada através de contratos de arrendamento, onde a figura do produtor rural não deixava de existir, mas apenas a sua função como produtor e dono da matéria prima que estava produzindo para processamento. A história acabou na década seguinte, com a crise que afetou profundamente o setor, tornando praticamente inviável a produção de cana-de-açúcar. Não havia mais margem. Desta forma as usinas acabaram por assumir a produção da matéria prima em sua quase totalidade até chegar no cenário que temos hoje em dia.

Para toda ação, sempre existe uma reação. E com esta verticalização, as usinas também passaram a assumir o riscos maiores no que diz respeito à produção de cana. Um primeiro risco é o custo que nem sempre passa a ser menor ao passar a produção para dentro de seus quintais. Outro é que fica mais exposto aos velhos problemas que enfrentamos todos os dias no campo quando se fala em produção e produtividade: Tudo vai bem, desde que o tempo ajude.

Após mais de uma década de safras que possibilitaram uma boa sobrevivência deste modelo de produção, eis que o problema surge com dois anos consecutivos de frustração de safra. Qual o problema disto? Simples: uma usina para moer 100 mil T de cana tem o mesmo custo que para moer 120 mil T, como exemplo. Desta foram, quanto menor a quantidade de cana processada, menor a quantidade de açúcar e álcool disponível para ser vendido e desta forma pagar as contas da usina. O açúcar e o álcool produzidos ficam mais caros, e este custo nem sempre pode ser repassado aos clientes.

Uma matéria publicada no jornal O Estado de São Paulo no dia 21 de maio deste ano ilustra muito bem esta questão. Lá cita uma queda de 60 milhões de T de cana em relação ao projetado anteriormente para estas duas últimas safras. Isto acabou por elevar o custo de produção de açúcar em 60% e o de álcool em 46%. Em consequência 17% das usinas estão afundadas em dívidas, necessitando de forma urgente de aporte de dinheiro, outras 18% estão sem condições para realizar novos investimentos.

Este é exatamente o risco que as indústrias de suco de laranja estão assumindo e já previstas em artigo publicado anteriormente. Com a extinção dos produtores de matéria prima, dois anos seguidos de uma crise causada por frustração de safra devido a eventos climáticos fez com que a dita “economia” com a cana própria se mostrasse um péssimo negócio. Da forma como ficou, as usinas não tiveram a opção de recorrer a qualquer tipo de excedente de produção proveniente dos produtores para firmar contratos de fornecimento para a safra que estava se apresentando fraca. Não havia a possibilidade de recorrer ao mercado, brigar pela cana de fornecedores e obter matéria prima para moer em suas unidades, mesmo que a custo mais alto. Se alguém quiser saber como irá ser a citricultura daqui a alguns anos? Olhe bem para o que está acontecendo com as usinas de açúcar e álcool. O processo está cada vez mais parecido, com uma única diferença: A cada ano que passa estamos mais próximos a sucessão de poder que irá ocorrer necessariamente nas indústrias de suco, em sua totalidade geridas por firmas familiares. Parente não necessariamente rima com competente no que se diz respeito à gestão de negócios. Insisto neste tema devido ao tamanho de sua relevância e tenho certeza que o tempo acabará por comprovar minhas suspeitas.

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